[Marcelo Novaes]
Você não sabia que esses olhos
eram meus, eram claros, eram mel.
Nem que a voz soava violoncelo,
próximo ao Natal.
E que eu deixaria seu corpo doído
por uma semana, na única noite de cio
passada no chão.
Você não sabia que, no meu quarto,
a luz tremeluzia. E que meu respirar
comportava tal silêncio: desses que só
pode dar água corrente, o sol nascente,
uma manhã no Chile.
Você não sabia que cabia no existir
tal densidade: bem maior que o tônus
muscular colado aos ossos. Por você
tudo apalpado. E nem conhecia o amor
que era canto e língua procurando cada
canto e tudo que os outros haviam deixado
intacto. Amar amor gentil, antes e depois do
ato.
Você não sabia o outro nome, pelo qual
te chamaria, com insistência, a certa altura:
nome lindo de se colocar aqui agora. Aquele
que um dia - intuo muito bem porque -, você
enterrara. Mas eu te sei nome e sobrenome,
também lá e então, e desde sempre. E saberei
cem jeitos diferentes de te chamar, Adrianna.
* Publicado no Balaio Porreta 1986 nº 2558