okavango



tudo em meu poema
desce montanhas
com sede de sol e de sal
e corre líquido sonhando
com a invasão ocre
do encontro pelo rio


tudo em meu poema
alaga e depois seca
em minha floresta
de papiros
enquanto escrevo
sobre meus desertos
e minhas águas





* Diálogo de Paulo de Carvalho com o poema Compondo sobre águas
* Publicado no Balaio Porreta 1986 nº 2581

a lâmina



o abstrato impossível
constantemente renovado
diante dos meus olhos
por onde as águas
correm junto ao meio
fio da lâmina
das palavras
que penetram
afiadas e iluminam
os vermelhos versos
contidos no meu corpo



enchente



suo a densidade
dos meus dias
num poema caudaloso
que transborda aqui dentro
e me inunda de vozes
e de silêncios






* Publicado no Balaio Porreta 1986 nº 2452

arbórea



incorporei a poesia
arboreamente


incorpodespi o concreto
as paredes e o cimento
dos entendimentos


e mano a mano com manoel
fiz de mim maria-de-barro
construindo minha casa
de sensibilidades
nessa que me tornei
árvore